Sempre que temos uma urgência nas nossas famílias, e quando sabemos que não temos médico de família e que, quando temos, muitas vezes não arranjamos consulta, devido ao elevado número de doentes por médico, dirigimo-nos ao hospital mais próximo da nossa residência, onde existe (ainda!) a especialidade de pediatria. Estou a falar do hospital de Torres Novas que serve um dos maiores concelhos do país e alguns concelhos onde não existe essa especialidade, como é o caso do Entroncamento e outros concelhos limítrofes que também se socorrem da especialidade daquela unidade hospitalar. Ora, quando nos dirigimos a um hospital, sabemos que vamos perder algum tempo considerável, até sermos atendidos pelo médico, uma vez que raro é encontrar aquela unidade de urgência infantil vazia. Depois, e consoante a gravidade do problema das crianças e o número de pediatras de serviço, como é lógico, as consultas levarão mais ou menos tempo. Mas conta-se sempre com um dia perdido. Se ainda tivermos de recorrer a uma especialidade que só existe num hospital a cerca de trinta ou mais quilómetros da unidade hospitalar onde nos encontramos, porque o outro, situado a menos quilómetros de distância não tem médico àquela hora, porque já saiu, após fazer não sei quantas horas seguidas de serviço, por haver falta de médicos daquela especialidade, já podemos fazer uma ideia do tempo perdido, para já não falar no desgaste físico e psicológico que tais mudanças acarretam. O que é algo incompreensível, é que, depois daquele dia perdido, temos de perder outro dia sentados numa cadeira de um Centro de Saúde à espera de ser consultado por um médico que lhe passe um atestado de doença da qual ele nada sabe, limitando-se a acreditar na palavra da pessoa que lhe apresenta o papel, o que não deixa de ser arriscado para o próprio médico, dada a má fé que reina por aí. (O que costumo fazer é trazer do hospital o papel indicador da presença da criança e outro do acompanhante, para mostrar a esse médico, para além do livro de saúde da própria criança, quando o médico da urgência tem tempo para escrever nele os dados relativos à doença desse episódio de urgência, o que nem sempre acontece.) Ora isto equivale à perda de dois dias, sendo um deles destinado só à aquisição de um atestado, uma vez que o papel passado pelo hospital só diz que a criança esteve lá naquele dia, não refere mais nada sobre a natureza do problema e o prazo provável de convalescença que a doença normalmente leva.
O que eu me farto de apregoar, sem êxito, é que tudo pode e deve ser feito no próprio hospital. Assim como se passam as receitas necessárias ao tratamento da doença, o tempo provável de convalescença é também necessário. O que deveria haver era um programa que ao mesmo tempo que passasse a receita desse também para introduzir, no mesmo papel ou noutro, esse período de convalescença, permitindo, deste modo a perda de tempo que as pessoas levam a correr de uma instituição para outra, e a vez que estão a tirar a outras pessoas que se encontram realmente doentes e que precisam dessa consulta e que provavelmente terão de procurar as urgências de um hospital, porque muitas das consulta se destinam, e só, à prescrição de medicamentos e à redacção de atestados. Falei da pediatria mas o caso também se aplica, é claro, às urgências dos adultos.
Todos os anos chego ao fim do ano lectivo mais ou menos cansada. Mas como este último, só o de há dois anos atrás. Razões? Imensas… Sempre que nos dedicamos de corpo e alma a algum projecto, saímos dele sempre cansados. Trata-se também de entender esta profissão de uma maneira diferente daquela como era entendida, aqui há uns anos atrás. De facto, o professor deixou definitivamente o alto da sua cátedra para descer até aos alunos. Tem de ser. Os tempos são outros e a maneira de encarar o ensino e a relação professor-aluno tem, também, de ser outro. Até a avaliação.
Este ano coube-me uma turma de CEF, de iniciação, quase toda ela formada por alunos com registos de incidências graves no seu passado, aquilo que se designa habitualmente por alunos problemáticos, devido à sua postura e comportamento. Não vou negar que, no início, como era uma professora nova na naquela escola, os alunos passaram todo o primeiro período e, algumas vezes, no segundo, a fazer um braço de ferro comigo. Era difícil concentrarem-se e ainda mais fazê-los trabalhar. A matéria da minha disciplina, em muito, para não dizer quase em tudo, igual aos programas do currículo normal, não pareciam despertar-lhes o interesse. Não os culpo. A culpa cabe somente às pessoas que seleccionaram e organizaram o programa que em nada se adapta a este perfil de alunos. O português deveria estar mais voltado para o lado prático da vida, o que não acontece. Mas, como ninguém é visto e achado nestas decisões, temos de cumprir esse programa. Estes alunos são alunos muito inteligentes, embora com vidas complicadas. O que eles pretendem é aprender uma profissão e ganhar dinheiro para se sustentarem a eles e à família que um dia, eventualmente, formarão. Detestam teoria e tudo quanto se relacione com ela. Com eles, até o velho conceito de avaliação teve de ser repensado. Os testes deixaram de ser sobre matéria memorizada, para serem sobre matéria pesquisada, até os exercícios, para lhes facilitar a tarefa nas aulas… Alunos com grandes dificuldades de concentração, a matéria teve de ser dada de forma a parecer muito fácil… e tive alunos que perceberam a divisão e classificação de orações de uma forma quase imediata… também, mas mais no início das aulas, tive de me sentar, muitas vezes, ao lado de um dos alunos que não conseguia concentrar-se de forma a resolver os exercícios… aos outros, foi-lhes explicado o que estava a acontecer e porque estava a acontecer assim. Nem sempre resultou, uma vez muitos deles aproveitavam a minha diatracção, para perturbarem os colegas e, consequentemente, a aula. Sempre que me levantava do pé desse aluno, para atender os outros mais autónomos, quando regressava, ele estava no mesmo ponto onde o tinha deixado. Durante os momentos de avaliação, eu pude verificar como o stress deles aumentava consideravelmente… lembro-me de um aluno inteligente dizer-me, Professora, eu estou farto disto, apetece-me rasgar esta m… (o teste) e ir-me embora. A minha ronda parou logo ali. Dobrei os joelhos, ficando à altura do aluno sentado. Olhei para o teste dele e verifiquei que já respondera a algumas questões. Olha, respondi-lhe, já fizeste bastante, e deve dar quase para positiva, mas se fizeres estas duas, de certeza que dá. Olha para esta pergunta, é bastante fácil. Tu sabes a resposta., incentivei-o. O aluno leu a pergunta com a minha ajuda e só o vejo a agarrar na esferográfica e a escrever. Vês, continuei eu, conseguiste. Agora, olha para esta aqui. Eu não sei esta. Deixe-me ir embora!, insistiu ele, Escuta, insisti, tu fazes conforme sabes. Ele lá leu a pergunta e escreveu. A minha alegria cresceu. Vês?, disse-lhe, acertaste a pergunta! Chegada a latura da entrega do teste, fiquei à espera da reacção dele ao ver a nota. Então, perguntei-lhe, valeu a pena ou não? Ele sorriu, abanando a cabeça afirmativamente. Não foram precisas palavras... para quê?
Ambos estávamos felicíssimos com os nossos esforços…valera a pena! E eu, estou arrasada, é verdade, mas feliz.
Projecto Alexandra Solnado
links humanitários
Pela Libertação do Povo Sarauí
Músicos
artesanato
OS MEUS BLOGS
follow the leaves that fall from the trees...
Blogs
O blog da Inês
Poetas