Há uns tempos atrás, estava ainda desempregada, pelo que, muitas das refeições tinham de ser bem pensadas, no sentido de gerir, da melhor forma o magro rendimento de que dispúnhamos. A primeira preocupação que tinha era a de pagar as contas relativas às despesas mensais, só depois podíamos pensar
Eu também fui uma criança da rua, mas na década de 70, com a agravante de ser uma miúda, o que nunca foi bem visto pelos mais conservadores. Contudo, ser criança da rua, na década de 70, numa pequena vila do interior, não é o mesmo que sê-lo, agora, e, ainda por cima, nos arredores de uma grande cidade, onde o perigo é muito maior. Hoje em dia, esta situação ainda é comum, em famílias cujos progenitores trabalham e não têm quem olhe pelos filhos, durante a sua ausência, devido às magras e suadas finanças e também devido à ausência de familiares, próximos ou distantes, capazes de o fazer.
Os meus pais trabalhavam durante o dia, o meu pai, muitas vezes, de noite, pelo que precisava de recuperar essas horas de sono perdidas, durante o dia. Esta ausência levou-me a criar um ambiente, (por vezes pesado, devido ao silêncio e ao vazio), só meu. Eu decidia como distribuía o meu tempo e o que fazia com ele. De todas as famílias que habitavam nas imediações do meu bairro, só um amigo meu de infância estava em circunstâncias semelhantes às minhas: ambos os pais trabalhavam, embora tivesse os avós maternos que olhavam por ele e pela irmã mais velha. Todas as outras crianças tinham a mãe em casa, pelo que havia sempre alguém que ia até ao portão olhar ou chamar pelo nome dos filhos. Nesse bairro, todas as pessoas eram da mesma cor, haviam sido formados na mesma cultura e professavam a mesma religião. Nada nos distinguia, para além da natureza de cada um. As casas das minhas vizinhas de infância foram uma segunda casa para mim, fazendo-me companhia nas horas vazias e, embora me distraísse em casa, havia muitos momentos em que necessitava de sentir a presença de alguém, junto de mim e, quando chegava a hora de recolher, eu regressava, muitas vezes, ao silêncio da casa vazia. Contudo, a maior parte do tempo, era passado na rua onde brincava com os rapazes ou com as moças, dependendo de quem encontrasse. O espaço imenso que rodeava as nossas casas, situadas numa zona quase limítrofe da pequena vila, onde os campos se estendiam até ao grupo de casas mais próximo, era o cenário das nossas deambulações. As ruas, onde passeávamos de bicicleta, que, muitas vezes nem alcatroadas eram, poucos carros ou pessoas desconhecidas ali passavam, suscitando sempre a nossa desconfiança, quando tal sucedia. Não tínhamos as más companhias que nos liderassem por caminhos desviantes, pelo que vivíamos num universo seguro. Fazíamos o que as crianças de hoje ainda fazem: brincadeiras e jogos de toda a espécie. Os laços afectivos que se criaram, ligam-nos ainda hoje, pelo menos a alguns de nós. São estes laços que levam muitas crianças e adolescentes a encontrar, nos outros, os alvos dos seus afectos, retribuídos ou não, e que muitas vezes substituem a família ausente ou o ambiente conflituoso do lar. Os que têm a sorte ou a facilidade em conhecer bem os amigos que os rodeiam, poderão escolher entre o que é bom ou mau para eles, os outros perdem-se em amizades duvidosas ou que adoptam na ausência de outras melhores. São estas amizades que lhes valem, pensam eles, quando têm um problema que requer solução imediata, não se dando conta que não se meteriam nas situações, se não fossem as companhias. A sorte ou o azar destas crianças consiste na capacidade de perceber a natureza daqueles a quem tratam por amigos, e nem sempre isso é fácil ou mesmo possível… uma vez que há factores que condicionam esses mesmos juízos. Eu também me enganei na opinião sobre algumas amigas… e, hoje, sei que fui e sou amiga, ao contrário delas…
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