Estava a trabalhar em casa, num daqueles dias livres de componente lectiva mas dedicado à elaboração de materiais didácticos, quando ouvi uma estória extraordinária para crianças. A minha filha mais nova, aproveitando este dia em que fico em casa a trabalhar, quis também ficar comigo, mesmo sabendo que não lhe poderia dispensar muita atenção. Ligou a televisão da cozinha, preparou o pequeno-almoço (que raramente tomo) para ela e para mim e, terminada a refeição, deslizou para outros horizontes deixando a pequena televisão da cozinha ligada. A indolência, aliada ao entusiasmo com que trabalhava no computador, fez com que o aparelho continuasse ligado. A certa altura, quando procurava resolver um problema inesperado da impressora, ouvi uma voz que contava uma estória de duas cegonhas, mães de um rapazinho. À medida que o enredo se desenrolava, ia ficando cada vez mais fascinada. O que mais me encantou foi a ideia e a sensibilidade com que foi desenvolvida. A mensagem social não me passou despercebida. A minha posição sobre ela também é conhecida. Sempre defendi e defendo a ideia da estória. O que interessa é o amor e não interessa quem ama. O que interessa é a natureza da pessoa e não quem é. O problema, como não poderia deixar de ser são os outros, mas o que se estranha hoje, amanhã é encarado com naturalidade. Tudo tem o seu momento. O que está errado, na minha opinião, é que encarar-se mais o amor no aspecto físico do que espiritual. Quando encontro algumas pessoas, tenho a nítida sensação que nada me dizem ou então, pelo contrário, que me dizem algo. E quando nada me dizem, nem vale a pena forçar, respeito-as, nada mais. O que quero defender aqui é que todos têm a liberdade de escolherem o seu parceiro. Que o amor, antes de ser físico é espiritual. E sei a força arrebatadora que ele tem. Que todos temos necessidade de amor, não importando de onde ele vem. Deve-se realçar que é estúpido pensar que a adopção por casais homossexuais pode trazer problemas à criança. Problemas têm aquelas que não sabem o que é o amor da parte daqueles que as deviam amar e proteger, ainda que venham de famílias ditas normais. O que interessa, repito, é o amor e este está acima do sexo, religião, política… A criança antes de tudo precisa de se sentir amada e só no amor ela pode encontrar-se e crescer equilibrada e feliz. E é disto que precisamos: de crianças felizes e equilibradas que possam construir um futuro melhor e mais tolerante. Ah, já agora, o livro, cujo título desconheço, é um dos que vou comprar para juntar à minha colecção infantil, que não é grande e que, com muita honra, irei ler aos meus filhos. Faço questão disso. A autora é a excelente Ana Zanatti. Muito obrigado por esse maravilhoso livro! É desta forma que se combatem preconceitos mesquinhos que se debatem na escura lama da ignorância e da má vontade.
Um dia, entrei na biblioteca escolar, onde me encontro a leccionar e dei com alguns quadros pendurados na parede. Senti-me imediatamente atraída por eles. O traço, a atmosfera, a composição, o tema… alertaram os meus sentidos. Desloquei-me lentamente ao longo das paredes completamente fascinada com o que observava. À questão sobra a autoria dos mesmos, foi-me dito que eram de uma colega da escola. Não mais me esqueci daquelas pinturas que se haviam tornado tão familiares. Uns tempos depois, como não poderia deixar de ser, descobri a autora. Conversámos e estendemos a nossa amizade recente às ruas da cidade.
Um dia, quando menos esperava, ela lançou-me um desafio. Apresentou-me as pinturas scanizadas e pediu-me que, ao observá-las tentasse, construir uma estória para as mesmas. Estou habituada a desafios solitários, mas, apaixonada pelas imagens, respondi que iria tentar. Chegada a casa, observei atentamente as imagens que, segundo a autora não tinham relação alguma entre si. Não parecia conseguir arranjar um fio condutor entre elas. Fui tomada de um pânico súbito. Teria eu aceite um desafio que não venceria? Voltei a mergulhar nas imagens respirando a sua atmosfera… e tudo se tornou subitamente claro. Alinhei as imagens, deixando algumas de fora. Não, não era isso que pretendia e não era seguramente isso que a minha colega quereria. Depois, deste modo, nunca seria um verdadeiro desafio. O verdadeiro desafio passa por não deixar imagens de lado. Voltei a imergir na atmosfera das imagens… Desta vez, imagens adormecidas da minha própria infância soltaram-se no meu consciente. Voltei a colocar as imagens em ordem e… tinha o enredo acabado. Foi então que comecei a escrevê-la para não mais a deixar. Não demorou muito tempo. Mas, durante o tempo em que ela se gerava na minha cabeça, os mais diversos sentimentos tomaram conta de mim, numa viagem vertiginosa a todos os recantos do meu ser. Sim, as imagens tinham uma estória, a sua… foi só descobrir a sua mensagem ou melhor – a minha. Como todos enredos, ele pode ter o final que nós lhe quisermos dar. Este parece ainda não o ter. Embora já o tenha alinhavado na minha mente, algo em mim parece resistir ao acrescento. Mas tenho a certeza de que vou fazê-lo. Parece faltar qualquer coisa ao enredo. E os finais felizes são necessários para as crianças. Elas precisam de ter a esperança de que tudo tem uma solução, e que se não a encontramos não é porque não haja, só não a encontrámos.
Fátima Nascimento
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