Regresso à minha infância. Tempo indeciso. Local preciso. Cenário estranho. Personagens duvidosas.
Brincadeira em casa de uma vizinha. Normalidade aparente. Duas cabeças debruçadas sobre uma precária construção de lego. Poucas peças. Os minúsculos bonecos de plástico. O interesse. A alegria. A personagem vivida na boneca.
Súbita interrupção. Um homem ansioso. Perdido. Alucinado. Feroz. Sinal gestual para a filha. O acordo tácito. Altura de ir! Vens! E trá-la! A minha confusão. A miúda acompanha o pai. Olhar saudoso lançado às bonecas. Recusa íntima. Aviso? A continuação da narrativa imaginária. A minha boneca. O meu eu plástico. O movimento da boneca no cenário infantil escondida entre o polegar e o indicador. O fio da narrativa tecendo novos meandros. Nova interrupção. Vozes adultas alteradas. Presença da miúda mesmo necessária? A minha presença exigida pelo homem. A miúda tem de estar aqui. Sim! A impaciência da mulher. A voz masculina alterada pelo medo. Insistência. O meu nome suspenso do ar agitado. O meu afastamento relutante. O abandono saudoso da brincadeira. O corredor obscuro. A agitação no hall de entrada. Paragem à entrada. O meu atrevimento morre à entrada. Cenário macabro. Estupefacção. Porta estranhamente decorada. Réstias de cebolas. Réstias de alhos. Ferraduras suspensas de fitas e descuidadamente pintadas de cinzento. As incorrecções geradas pelo uso deficiente da improvisada maquilhagem. O nervosismo masculino. A aflição na fronteira da loucura. A presença da filha e da mulher à esquerda. O contágio do nervosismo. A dança do homem no espaço vazio. Não se mexam. Redistribuição do espaço. A miúda empedernida. Só a mente funciona. Os sentidos alertados. A bandeira vermelha erguida. A insegurança. A incompreensão. A minha estátua. O avantajado traseiro esticado na minha direcção. Os olhos colados à abertura do correio. A pala perpendicular ao ângulo da porta. O sol inundando a rua empoeirada com os dentes brancos salientes. A vontade de encontrar aquele sol. O arrefecimento do espírito. O tremor da voz masculina. Está achegar! Está a chegar! Para a mulher e a filha. Estão a sentir? Negação da cabeça. Os olhos fixos no filme ausente. Admiração. Não? Eu sinto. Nervosismo acentuado. Como é que vocês não sentem? As duas vozes femininas. Eu não sinto nada. A minha confusão. Incompreensão. A minha figura aprisionada. A mente aguçada pelo instinto. Que se passava? Estariam à espera de alguém? Um homem? Seria mau? Porque teria de estar ali? Acordo dos pensamentos. Novamente a voz masculina. Está rua! Agora já devem sentir! O aceno afirmativo das duas colaboradoras. A voz da mais velha. Agora já sinto! Corroboração da mais nova. A minha mente aprisionada no corpo sem vontade. A minha incompreensão. A minha aflição. O desejo do refúgio do lar vazio. A impossibilidade de me mexer. O terror vomitado do homem. Os cruéis lábios finos tensos de medo. O rosto despido dos imprescindíveis óculos. As faces lívidas. A observação cautelosa da superfície do meu crânio com a mesma mal disfarçado ódio. Regresso à posição vigilante. A pala da abertura do correio baixa como uma cortina. A coragem escondida nos bolsos das calças imensas. O proeminente estômago ameaçando a carpete da entrada. Levantamento arriscado do pesado corpo. Sinal com a mão. Os outros dois seres atentos. Quatro estátuas suspensas nas malhas do tempo. O meu desconcerto. Incompreensão. Impaciência. Um teatro macabro fraco enredo. Desconhecimento do meu papel naquele cenário. Subitamente. O movimento das estátuas humanas. O alívio. O sussurro. Já passou! As mãos agitadas como vassouras. O triunfador sorriso sereno para a esposa e a gaiata. Uma frase corre aos meus ouvidos. A calvície reluzia. Eu disse que conseguia! A miúda sem se conseguir mexer. O alerta da mulher. Esquecera a minha estátua. Já podia ir. Sem necessidade de me prender. A corrida para casa. As queixas. A indiferença da minha mãe. Omissão da situação ao meu pai. Polícia. O medo das possíveis zangas. Revelação ao meu pai. Cólera justa. Decisão. Caminho para a casa do vizinho. Passo determinado. A segurança da atitude. Recebido à porta. Responsabilização do adulto. Tentativas de explicação infrutíferas. Não é a sua filha! Queria ver se fosse! Palavras atiradas à cara do prevaricador. A ameaça. As largas costas vencidas pelo medo.
Dias mais tarde. Em casa. Palavras da mulher. Avisei-te. Resposta. Pensei que a mulher o segurava. Consegue sempre! Ainda a mulher. Mas isto foi muito grave. A voz do marido. Espero que isto não se espalhe. A mesma voz de suporte afectivo. Ninguém fala disto! Insistência do meu carrasco espiritual. Mas os colegas. Os familiares. Narrativa dos acontecimentos ao meu tio. O irmão mais velho do meu pai. Aos meus avós. A mesma revolta. Apoio ao meu pai. Condenação da minha mãe. Condenação dos vizinhos. Apoio familiar ao meu pai. Sensação de segurança retomada. A justiça feita. O pai. O defensor da sua filha. O meu justiceiro.
Desde pequenos que somos confrontados com histórias populares que nos falam delas. A bruxa que faz o mal à princesa e a fada que a ajuda. A nossa vida está cheia de bruxas e fadas… e, muitas vezes, está mais cheia de bruxas que de fadas, pensamos nós, quando vemos as fadas transformarem-se inexplicavelmente em bruxas… Mas deixando o sentido figurado da questão e concentrando-nos na realidade quotidiana, a maioria das pessoas com quem tenho falado, seguem, para se defenderem de más interpretações, aquela célebre expressão que diz “eu não acredito em bruxas mas que as há…há”. De facto, raramente esta questão é abordada com a frontalidade com que merece ser abordada, aprofundada, debatida e, o mais importante de tudo, solucionada… uma vez que ela é mais frequente e grave do que se possa imaginar! A sociedade, mais uma vez, faz desta questão aquilo que faz com muitas outras… ignora-a. Este é um assunto que só é falado em família, ou em círculos muito restritos de amigos, e sempre com medo que qualquer pormenor transpire para o conhecimento dos outros. Ora, isto leva-me a pensar que, enquanto as pessoas assim agirem, estão, sem querer (ou não!), a facilitar a vida àqueles que fazem o mal, pois o medo destas é serem descobertas… enquanto isso não suceder, continuam calmamente a fazer o mal quando e a quem lhes apetece. Mas, estou convencida de que futuro caminha calmamente no sentido em que um dia se poderá, finalmente, falar de tudo abertamente! Mas não é do mal que eu quero falar, é do bem… e pensar que, embora haja muitas pessoas a fazer o mal, existem outras que fazem o bem. Estas são pessoas anónimas e simples que, em vez de levarem uma vida cómoda e despreocupada, resolveram, por imposição ou não de Deus,( falo daquelas que nunca quiseram saber desse poder para nada, mas não tiveram outro remédio senão aceitá-lo!) dedicar a sua vida a ajudar todos aqueles que necessitam! E as histórias do mal não cessam, repetem-se vezes sem conta, muitas vezes com maior ou menor gravidade… e todas as pessoas que passaram por situações difíceis, para elas inexplicáveis e também para a ciência, (que lhes dá outros nomes!) é que sabem dar o valor à alma grande destas pessoas, que expõem a sua vida ao mal, combatendo-o. E sem ninguém em quem se apoiarem, a não ser os seus conhecimentos e Deus! E isto não pode, nem deve continuar assim... Para começar, a igreja devia ser a primeira a dar o passo nesse sentido e a reconhecer que a vida não se resume só àquilo que se vê, mas também é aquilo que está para além do que pode ser detectado pelos nossos sentidos e, sabendo da existência do mal, deveria ser a primeira a combatê-lo ou a ajudar a combatê-lo… Como? Apoiando e protegendo as pessoas que, pela graça de Deus, receberam esse poder para combater o mal. Enquanto isso não acontecer, a generalidade das pessoas que precisam de ajuda, têm de se defender do mal conforme sabem e podem… e, claro, com a ajuda destas pessoas boas que são as fadas dos nossos contos populares e que conseguem verdadeiras maravilhas com esforço, determinação e persistência! E não nos esqueçamos que também estas fadas, por fazerem o bem, são alvos do mal!
Eu raramente me fio no que as pessoas dizem ou fazem, olho mais para as intenções que estarão por trás do que dizem ou fazem. É claro que é difícil descobri-las mas não é impossível, só requer tempo, atenção e paciência! Aprendi à minha custa, e com pessoas que eram muito “amigas”!
No dia-a-dia, todos ouvimos pessoas a queixarem-se de outras, das atitudes que tomaram ou daquilo que disseram ou fizeram… Ninguém é perfeito, mas também não vejo ninguém a tentar contrariar a sua natureza, tentando melhorá-la… o que se vê é que quase todos preferem viver a seu bel-prazer, dando largas à sua maneira de ser e justificando-se com os outros que fazem o mesmo ou ainda pior… e, desde que não sejam apanhados, não têm de mudar! O que anda na boca desse tipo de pessoas é esta máxima que defende que”vergonha é roubar e ser apanhado!” Acho que todos sabemos que a maneira de ser de cada um determina a sua moral ou seja a maneira como interioriza, (ou não!), e adapta os conceitos morais que lhes são, ou não, incutidos na infância e adolescência… Estas pessoas superficiais e ocas só têm a preocupação de manter o “verniz” intacto, para poderem estar bem vistas pelas restantes… o resto não interessa! E as pessoas que não se regem pelos parâmetros deles, não interessam, são consideradas aborrecidas, incomodativas e desinteressantes e são postas de lado! O pior de tudo é que este tipo de pessoas estão a aumentar e cada vez se torna mais difícil perceber a verdadeira natureza delas, uma vez que são mestres na arte do disfarce e o tempo destinado ao convívio é cada vez menor e não dá para conhecer verdadeiramente as pessoas! Posso dar vários exemplos que eu conheci, tendo em conta que não estão em causa as suas identidades mas as atitudes em si,.que devem ser denunciadas… Conheci uma pessoa de voz meiga, aparentemente humilde que parecia que até tinha medo de pisar o chão, alegre q.b. , dizia sempre aquilo que era certo, … bom, essa pessoa revelou-se uma das piores víboras que eu já conheci: manipuladora, intriguista e implacável! Ora, como esta há muitas… agora imaginem-nas actuando na sociedade, quer pessoal quer profissionalmente ou desempenhando cargos importantes! E são estas pessoas geralmente consideradas interessantes!
Um dia, conversando com um ex-drogado, cheguei à conclusão que a natureza humana faz, de facto, toda a diferença… os drogados que são boas pessoas agridem-se a si próprios, enquanto que os outros põem a sua natureza a funcionar e prejudicam tudo e todos para se ajudarem a si próprios… até na miséria a natureza humana faz a diferença! E não me venham dizer que é a droga! Ela é como o vinho, só mostra aquilo que há de pior em nós!
Partindo agora para o aspecto profissional… enquanto que as boas pessoas ajudam desinteressadamente outras pessoas que com elas trabalham, tendo em mente que é bom e saudável para toda a gente, as outras limitam-se a proveitar-se delas, a eliminá-las ou a desprezá-las.
Aqui, costumo também fazer a diferença entre as pessoas inteligentes e as espertas. Não passa de uma convicção minha… mas penso que as pessoas inteligentes vêem o que é melhor para todos, enquanto que os espertos vêem o que é melhor para eles…
No aspecto social ou familiar, é fácil também de perceber os efeitos das pessoas nocivas, quando elas mostram o sua verdadeira natureza… e todos conhecemos casos, não é assim?
Eu acredito nas boas pessoas e você?
Projecto Alexandra Solnado
links humanitários
Pela Libertação do Povo Sarauí
Músicos
artesanato
OS MEUS BLOGS
follow the leaves that fall from the trees...
Blogs
O blog da Inês
Poetas