Não é a primeira vez que escrevo sobre este tema. Vivemos numa sociedade tão estratificada que parece ser impossível para muitos perceber que, como cidadãos que somos, a lei deve ser igual para todos. Não faz sentido ser de outra forma. Nem deve ser de outra forma. E é uma gritante injustiça.
Aconteceu comigo este ano. Não percebo porque é que uns, quando estão doentes, podem escolher o local onde podem ser atendidos e outros são obrigados por lei a correr para o Centro de Saúde, levantando o corpo da cama de madrugada para fazer fila à porta daquela instituição. Sim, se não temos médico de família, temos de nos levantar muito cedo para garantir a consulta. E se nos descuidamos, já não há vagas. E isto acontece muito. Mais do que pensam as pessoas que governam este país, tão alheadas da realidade.
Um dia tive necessidade de ir ao médico. Sentia-me tão mal, que não consegui levantar-me da cama. Resultado: demasiado tarde para conseguir consulta. Tive de recorrer à saúde privada – facto que o estado agradece – onde me foi passado um atestado. Com grande surpresa minha, o atestado foi recusado na secretaria. Tive de perder outro dia de trabalho para me dirigir, desta vez, ao centro de saúde para que outro médico atestasse, noutro formulário, a minha condição física já atestada antes por outro. Os colegas efetivos, pasmados, não percebiam o que se passava porque entregam atestados dos mais variados médicos do sistema de saúde privado.
Percebendo a injustiça para com os professores contratados – eu já fui efetiva – tratei, pelas vias à minha disposição, de contactar o ministério da saúde contando o que me tinha acontecido e perguntando porque é que não disponibilizavam esses formulários eletrónicos aos hospitais privados e a outros centros particulares destinados ao mesmo objetivo. Tive reposta: pediam o número da ocorrência para poderem averiguar. Ora, não havia nada para averiguar. O que havia a fazer seria alertar para esta injustiça e dar a possibilidade aos professores contratados de poderem escolher o local onde querem ser tratados dando-lhes a possibilidade de levar o respetivo atestado sem mais delongas. E isso não sucede por serem contratados como se isso fosse alguma espécie de crime ou uma vergonha que os obrigasse a um tratamento diferenciado.
Acho que estamos tão habituados a uma sociedade diferenciada por classes sociais que nem damos conta das injustiças criadas na vida das pessoas. O próprio ministério, com este despacho normativo (ou lá o que é) acaba por prejudicar não só a vida às pessoas como também promove a falta ao trabalho. Antes de fazer seja o que seja, as pessoas que trabalham para o estado têm de pensar bem antes de redigir qualquer norma que vá condicionar a vida das pessoas. Essas normas - e conheço várias regulando vários setores relativos aos profissionais do ensino - são extremamente penalizantes o que leva as pessoas a desmoralizar. Esta é uma delas e não tem aparentemente razão de existir, para além da injustiça que acarreta, tratando os mesmos profissionais de forma diferente. Nem os sindicatos - dos quais já desisti há muito - parecem dar-se conta disto. Não faz sentido.
Sempre que temos uma urgência nas nossas famílias, e quando sabemos que não temos médico de família e que, quando temos, muitas vezes não arranjamos consulta, devido ao elevado número de doentes por médico, dirigimo-nos ao hospital mais próximo da nossa residência, onde existe (ainda!) a especialidade de pediatria. Estou a falar do hospital de Torres Novas que serve um dos maiores concelhos do país e alguns concelhos onde não existe essa especialidade, como é o caso do Entroncamento e outros concelhos limítrofes que também se socorrem da especialidade daquela unidade hospitalar. Ora, quando nos dirigimos a um hospital, sabemos que vamos perder algum tempo considerável, até sermos atendidos pelo médico, uma vez que raro é encontrar aquela unidade de urgência infantil vazia. Depois, e consoante a gravidade do problema das crianças e o número de pediatras de serviço, como é lógico, as consultas levarão mais ou menos tempo. Mas conta-se sempre com um dia perdido. Se ainda tivermos de recorrer a uma especialidade que só existe num hospital a cerca de trinta ou mais quilómetros da unidade hospitalar onde nos encontramos, porque o outro, situado a menos quilómetros de distância não tem médico àquela hora, porque já saiu, após fazer não sei quantas horas seguidas de serviço, por haver falta de médicos daquela especialidade, já podemos fazer uma ideia do tempo perdido, para já não falar no desgaste físico e psicológico que tais mudanças acarretam. O que é algo incompreensível, é que, depois daquele dia perdido, temos de perder outro dia sentados numa cadeira de um Centro de Saúde à espera de ser consultado por um médico que lhe passe um atestado de doença da qual ele nada sabe, limitando-se a acreditar na palavra da pessoa que lhe apresenta o papel, o que não deixa de ser arriscado para o próprio médico, dada a má fé que reina por aí. (O que costumo fazer é trazer do hospital o papel indicador da presença da criança e outro do acompanhante, para mostrar a esse médico, para além do livro de saúde da própria criança, quando o médico da urgência tem tempo para escrever nele os dados relativos à doença desse episódio de urgência, o que nem sempre acontece.) Ora isto equivale à perda de dois dias, sendo um deles destinado só à aquisição de um atestado, uma vez que o papel passado pelo hospital só diz que a criança esteve lá naquele dia, não refere mais nada sobre a natureza do problema e o prazo provável de convalescença que a doença normalmente leva.
O que eu me farto de apregoar, sem êxito, é que tudo pode e deve ser feito no próprio hospital. Assim como se passam as receitas necessárias ao tratamento da doença, o tempo provável de convalescença é também necessário. O que deveria haver era um programa que ao mesmo tempo que passasse a receita desse também para introduzir, no mesmo papel ou noutro, esse período de convalescença, permitindo, deste modo a perda de tempo que as pessoas levam a correr de uma instituição para outra, e a vez que estão a tirar a outras pessoas que se encontram realmente doentes e que precisam dessa consulta e que provavelmente terão de procurar as urgências de um hospital, porque muitas das consulta se destinam, e só, à prescrição de medicamentos e à redacção de atestados. Falei da pediatria mas o caso também se aplica, é claro, às urgências dos adultos.
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