Já alguma vez sentiram vontade de correr para trás quando se aproxima o fim do ano? Tentar desesperadamente permanecer no ano já vivido com medo do que o próximo seja ainda pior na nossa vida? Já senti isto algumas vezes, durante alguns momentos, nesta mesma época. Sim, durante alguns momentos só, porque não podemos (nem devemos) viver dessa maneira. O ano finda, mas este momento, marcado somente na nossa imaginação, é pura ilusão. Tudo continua na mesma. Os segundos e os minutos prosseguem a sua caminhada sequencial sem que haja forma de marcar tal momento, só existente no relógio. O fim de um ano é o começo de outro. Não há interrupções. Não há uma porta que se fecha e outra nova que se abre. É só continuação. Só para nós, os humanos, existe esta barreira imaginária. Mas nada muda. Os problemas de ontem e hoje continuarão a ser os de amanhã. As pessoas não modificam só porque se abre um novo ano. Tudo fica na mesma. A modificação é algo que não existe, pelo menos neste curto espaço de tempo. Por isso, há pessoas que não gostam de celebrar a chegada do novo ano. Mas a verdade é que também não podem deixar de pedir, nos seus corações apertados, um ano melhor do que o anterior. Mas até nos pedidos as pessoas já estão mais modestas. Já não pretendem um ano novo melhor mas igual ao anterior. Talvez essa modéstia marque a falta de fé ou a consciência de que tudo, apesar da vontade se manifestar em sentido contrário, ficará na mesma ou piorará. Não falo da crise. As crises fizeram-se para serem ultrapassadas. Nada mais. Refiro-me concretamente às pessoas. Para as coisas mudarem, as pessoas têm de estar à altura delas. Mas cada vez se vê menos isso. Estas crises aparecem porque as pessoas aparentemente habilitadas, parecem não conseguir estar à altura das situações criadas por outras. Esta crise, já que falamos dela, foi criada por pessoas e tem de ser ultrapassada por outras, senão pelas mesmas. Mas a crise já não é só financeira é uma crise de valores. Estes desapareceram. E se os nossos antepassados já pagaram caro essa falha, nós continuamos (e continuaremos) a pagá-la. Cada vez com maiores facturas. Não vamos pensar que os problemas com que nos deparamos são diferentes dos que viveram os nossos antecessores. Não é. São os mesmos embora mascarados com vestes mais modernas. Se séculos não modificaram as nossas mentalidades, não será o ano novo que trará essa modificação. A verdadeira modificação passa por dentro de cada um. Há, de facto, aqueles que querem modificar e estão dispostos a isso, mas há toda uma corrente que, por estar a ganhar com as coisas tal como estão, não querem modificar nada. Enquanto a modificação não for geral, nunca conseguiremos nada. Ou então andaremos alguns anos para a frente, em termos de mentalidade, para depois, ao mais pequeno pretexto, regredirmos significativamente. Enquanto assim for, não poderemos esperar nada. Às melhoras rápidas seguir-se-ão longos períodos de crises. É este o panorama que se avizinha em cada fim de ano. Ainda assim, precisamos deste momento de formulação de votos para ganharmos ânimo suficiente para enfrentar o novo ano ou arriscaremos o desânimo total. Ainda que não acreditemos, temos de os fazer. Não temos mesmo alternativa. Só que sabemos que nem tudo está nas nossas mãos. E é talvez seja isto que nos assuste.
O Natal é um período mágico. Nele se diluem todos os medos, todas as preocupações, todas as raivas, todos os ódios… Vive-se um clima de harmonia excepcional exclusiva desta época. A pessoa concentra-se exclusivamente nas festas que se avizinham, na comida, nas prendas, na família… mas há um sentimento morno no ar, que nada tem a ver com a coluna quente de fumo que se desprende da boca do assador das últimas castanhas da época. Os traços faciais estão mais diluídos e o rosto parece emitir uma luz que vem da alma. Há uma inevitável esperança que preenche os espíritos das pessoas com que nos cruzamos na rua. Mesmo vivendo momentos difíceis, que ameaçam prolongar-se por uns bons longos anos, as pessoas necessitam de viver este momento, que lhes dará o ânimo que irá sendo carcomido pelos bichos da incerteza e da instabilidade, ao longo do ano que se aproxima. Esse estado de espírito começa a desvanecer-se logo a seguir ao dia de Natal. As notícias, que preenchem os ecrãs, anunciam um ano problemático cheio de aumentos e desemprego, enfim… anunciam aquilo que todos já sabemos mas nos recusamos a encarar, porque não queremos perder esse estado de graça, com que somos agraciados nesta excepcional época – não existe abismo nenhum entre o novo ano e o precedente, mas uma simples continuação. As pessoas acordam do seu curto estado de graça, para enfrentarem novos e velhos problemas do país que não tem pessoas capazes de lidar com as situações criadas interna e externamente. As velhas soluções servem para tapar os velhos novos problemas existentes. Sim, porque dentro do sistema capitalista, os problemas repetem-se e, enquanto dermos mais importância ao dinheiro que às pessoas, menos soluções possíveis encontramos para ele. A dura realidade faz renascer os receios que ameaçam corroer o sentimento harmonioso que preenche as esfomeadas almas, desequilibrando-as e ameaçando-as novamente com o fosso do desânimo, para onde, invariavelmente, somos projectados, ano após ano. Sim, não se fecha nenhum ciclo (como gostamos de pensar) antes se continua o que estivemos durante um ano (e mais!) a percorrer. Somos, aliás, uma consequência dele.
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