Foram três dias de férias. O contexto económico não dá para mais. Mas foi como se tivessem sido trinta! Não podia adiar mais. O mais velho, após receber o salário foi passar alguns dias a casa de uns familiares, para mudar de ambiente. As irmãs ficaram. Porém, como definhassem a olhos vistos, resolvi que era o momento certo para agir. Fazia dó olhar para as suas caritas desanimadas. Falámos em partir de férias por uns dias, poucos. A minha filha do meio suplicava por esse tempo ainda que pouco. Hesitei. O contexto não era o melhor. Ainda à espera de uma colocação incerta, não me queria aventurar. O boletim meteorológico não dava notícias animadoras. Prometia chuva e céu nublado para o interior norte e centro. Valeria a pena sair numa altura dessas? Tentaríamos o Algarve, ainda que fora de mão? Não era talvez a melhor escolha por várias razões, apesar da promessa de sol. Aceitei o desafio. Peguei numa tenda pequena, retirada do sótão, e partimos à aventura, sem um destino certo. Escolhemos um destino entre as praias ocidentais. À medida que percorríamos as estradas, olhávamos o tempo sempre de cenho franzido. Chegámos ao destino, sem pressas, e aproveitámos o tempo cinzento sem nuvens, para montar a tenda. Ninguém tentara a tarefa antes. Outro desafio recheado de gargalhadas. Mas conseguimos. Quando o sol finalmente descobriu, já arrumáramos os nossos pertences na nova morada. Partimos à descoberta da praia, munidas de todos os objectos para nos divertimos. Passeámos bastante à beira-mar e descobrimos algo a que eu já não assistia há imenso tempo – a arte xávega de pesca. (Em tempos o areal da praia da Vieira assistia à partida e à chegada dos barcos de pesca. Transformada agora numa praia exclusivamente comercial, repleta de veraneantes no verão, não se pode pôr lá um pé.) Por momentos, recuei vários anos, entusiasmada com aquele tipo de pesca. Peguei nas minhas filhas e fomos assistir à retirada das redes. Escusado será dizer que não tem quase nada a ver com o que se fazia há trinta nos atrás. O barco tem motor, é muito mais pequeno do que aqueles que transportavam cerca de trinta homens, e é puxado para terra com a ajuda de um tractor que o puxa até um reboque com rodas, em cima do qual descansa. Antes de o arrumarem, alguns pescadores, munidos de pequenos baldes, retiravam a água salgada que entrara ajudada pela forte rebentação. A rede esticada espera o momento exacto para ser retirada da forte ondulação. O céu enevoado de maresia, em nada se comparava ao anterior ensolarado. Uma barra de aço com uma terminação em forma de quadrado aberto era colocada na posição exacta indicada pelo olho experiente do pescador que, junto do tractor, enrolava a rede com a ajuda de um aparelho ligado ao tractor que puxava calmamente a rede. A rede deslizava suavemente por aquela forma geométrica assente em cima de um fino tronco de aço. Passado algum tempo, vinha a tão ansiada rede, repleta de peixe de todos os tamanhos, misturados com alguns caranguejos minúsculo. O peixe, separado na areia e metido dentro de caixas de plástico, era vendido num leilão de praia aos veraneantes. Peixe fresco é sempre uma boa opção para uma refeição deliciosa. Dá-lhes a oportunidade de fazer algum dinheiro. E não é muito! E as redes são metodicamente esticadas esperando a próxima saída que, com um pouco de sorte, não demorará muito! Só o amor por uma arte antiga e pelo mar os faz continuar esta tarefa. São, na sua maioria, homens reformados das indústrias que teimam em enfrentar este mar tão revolto e tão imprevisível! Estranhei o tamanho do peixe, tão pequeno! Lembrava-me que, quando era pequena, era maior. A razão é simples. Sendo os barcos tão pequenos não dá para se aventurarem como os seus antepassados que chegavam até às 120 cordas (cada corda são 800 metros) e, como tal, não chegavam nem perto do peixe grande que passa mais ao largo. O que mais me emocionou foi o interesse dos veraneantes de todas as idades que acompanhavam as tarefas com a mesma emoção que eu experimentava quando era pequena. Os mesmos baldes de praia com água salgada onde jaziam pequenos peixes mortos, a mesma tentativa amedrontada de pegar nos animais que debatiam nas redes, abrindo desmesuradamente as guelras ou as pequenas mão que procuravam a maneira certa de apanhar o pequeno caranguejo sem ser surpreendido com uma mordedura. O mesmo contacto frontal, franco e directo com as gentes do mar… Foram só três dias mas a aprendizagem valeu por trinta!
Resta-me dizer que é na praia do Pedrógão, uma das praias pertencentes ao distrito de Leiria, que podem assistir a uma arte que já vai perdendo terreno com o avanço do tempo.
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