Um dia, entrei na biblioteca escolar, onde me encontro a leccionar e dei com alguns quadros pendurados na parede. Senti-me imediatamente atraída por eles. O traço, a atmosfera, a composição, o tema… alertaram os meus sentidos. Desloquei-me lentamente ao longo das paredes completamente fascinada com o que observava. À questão sobra a autoria dos mesmos, foi-me dito que eram de uma colega da escola. Não mais me esqueci daquelas pinturas que se haviam tornado tão familiares. Uns tempos depois, como não poderia deixar de ser, descobri a autora. Conversámos e estendemos a nossa amizade recente às ruas da cidade.
Um dia, quando menos esperava, ela lançou-me um desafio. Apresentou-me as pinturas scanizadas e pediu-me que, ao observá-las tentasse, construir uma estória para as mesmas. Estou habituada a desafios solitários, mas, apaixonada pelas imagens, respondi que iria tentar. Chegada a casa, observei atentamente as imagens que, segundo a autora não tinham relação alguma entre si. Não parecia conseguir arranjar um fio condutor entre elas. Fui tomada de um pânico súbito. Teria eu aceite um desafio que não venceria? Voltei a mergulhar nas imagens respirando a sua atmosfera… e tudo se tornou subitamente claro. Alinhei as imagens, deixando algumas de fora. Não, não era isso que pretendia e não era seguramente isso que a minha colega quereria. Depois, deste modo, nunca seria um verdadeiro desafio. O verdadeiro desafio passa por não deixar imagens de lado. Voltei a imergir na atmosfera das imagens… Desta vez, imagens adormecidas da minha própria infância soltaram-se no meu consciente. Voltei a colocar as imagens em ordem e… tinha o enredo acabado. Foi então que comecei a escrevê-la para não mais a deixar. Não demorou muito tempo. Mas, durante o tempo em que ela se gerava na minha cabeça, os mais diversos sentimentos tomaram conta de mim, numa viagem vertiginosa a todos os recantos do meu ser. Sim, as imagens tinham uma estória, a sua… foi só descobrir a sua mensagem ou melhor – a minha. Como todos enredos, ele pode ter o final que nós lhe quisermos dar. Este parece ainda não o ter. Embora já o tenha alinhavado na minha mente, algo em mim parece resistir ao acrescento. Mas tenho a certeza de que vou fazê-lo. Parece faltar qualquer coisa ao enredo. E os finais felizes são necessários para as crianças. Elas precisam de ter a esperança de que tudo tem uma solução, e que se não a encontramos não é porque não haja, só não a encontrámos.
Fátima Nascimento
Nunca percebi porque é que a ilha da Irlanda se encontra dividida em duas, quando o ideal é só um – a independência.
Tinha 17 anos quando morreu. Acompanhei a sua luta muda e determinada através da comunicação social. Ao princípio, ainda com esperança que se encontrasse uma solução para evitar a morte daquele homem ainda jovem. Uma vontade que se assemelhasse a um raio de sol trespassando as densas e negras nuvens. Nada. A dama de ferro não se comoveu e ele não desistiu! Um braço de ferro que terminaria com a morte deste que não desistiu do seu sonho. Já lá vão quase trinta anos! Depois de muitas conversações, muitas delas com a ajuda de intermediários conhecidos do mundo artístico (estou a lembrar-me de Bono, o vocalista da banda U2) que pareceram amenizar os ânimos e sossegar os ódios. Houve um vazio noticioso durante uns anos. Agora, voltaram os protestos à rua, ocupando alguns minutos do horário nobre do espaço noticioso. Esta breve manifestação dá conta que o ideal de independência não morreu no coração dos irlandeses, descontentes com a sua situação. Para mim, e ao contrário do que as notícias pareciam fazer crer, o problema entre as duas partes litigiosas não eram de natureza religiosa mas política. A nomenclatura usada era só uma maneira de os meios de comunicação identificarem as duas partes
Fátima Nascimento
O que sempre me atraiu nos outros países, não é só a paisagem mas todo um mundo cultural subjacente a ela. Conhecer novas línguas, novas pronúncias, enfim tudo aquilo que diferencia e logo caracteriza como país – a sua individualidade cultural. Confesso que não sairia do país se soubesse que o que lá iria encontrar é igual ao existe no nosso país. É isto que nos enriquece como pessoas - a diferença. Quando tive ou tenho oportunidade de sair e estabeleço alguns laços de amizade, sinto nas pessoas uma curiosidade sobre o nosso país que recai também sobre a nossa língua. Muitos querem saber como é esta ou aquela palavra em português para exprimir certo sentimento ou ideia, sentindo-se fascinados pela diferença. Lembro-me de, aqui há alguns anos atrás, um rapaz do país vizinho, pouco mais velho do que eu, pensar que a língua da Catalunha era muito semelhante à portuguesa. Talvez o ideal da independência o fizesse olhar para nós portugueses com um carinho que não nutria por Castela. Mais recentemente, conheci uma moça galega que também dissocia a cultura da sua província da Castelhana, dando voz a toda uma cultura galaico-portuguesa comum à história de ambas as regiões, em determinada época da história. Mais uma vez tive de defender que não tinha a certeza de que assim fosse. O castelhano invadiu todas aquelas regiões e as semelhanças que eles querem ter connosco são cada vez menos perceptíveis, quase não existindo. O que eles admiram em nós é o facto de sermos um país independente de Espanha, há imensos séculos (exceptuando o período de sessenta anos sob o domínio filipino). A nossa língua, factor essencial na nossa independência, embora muito semelhante ao Castelhano tem características e pronúncia próprias que aqueles adolescentes admiram. São jovens de gerações diferentes mas orgulhosos das suas diferenças culturais que os individualizam da restante Espanha. Ambos conseguem ler o português sem grandes problemas, esquecendo-se das semelhanças do castelhano ao próprio português. Ambos vêem nestas diferenças mais do que razões para fundamentarem as suas aspirações a uma possível independência. Falta a vontade política. Ambos conhecem o desespero do país Basco cuja cultura e cuja língua nada têm de semelhante a Espanha e a França, constituindo todo um mundo à parte. Nota-se a diferença quando saímos daqueles países e mergulhamos naquele mundo cultural com raízes que ascendem ao período pré-romano e que nada tem a ver com os dois países pelos quais se encontra dividido. O ideal de independência custa vidas: morreram imensos castelhanos, que quiseram subjugar o povo português, na tentativa de integrar o seu território nas suas muitas províncias, e muitos portugueses para manterem a independência de um território que durante muito tempo aprenderam que lhes pertencia, não por ordem genealógica da realeza mas por vontade popular. Durante todo este tempo, Portugal manteve-se independente graças à vontade de um povo que teimou em acarinhar uma língua com uma estrutura, um léxico e uma pronúncia diferentes. E não é só o caso do nosso país, há muitos casos por essa Europa fora. A única diferença é que uns além da vontade tiveram sorte, outros nem tanto. Este ideal não morre, ao contrário do que se possa pensar, passa de geração em geração e assume contornos mais ou menos pronunciados em determinadas épocas. Mas não morre.
Projecto Alexandra Solnado
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