Aqui há uns anos atrás e depois de uma perseguição violenta, originada por invejas, tive de pedir a demissão do ensino. Procurei alternativas para os dois anos de penalização que me disseram que teria. Não era assim. E só o M. E. mais tarde me informaria disso. Toda a informação posta a circular era falsa. Só os contratados estavam sujeitos a essa penalização, caso renunciassem a um horário. E, ainda assim, defendiam que tudo dependeria da escola. Haviam aquelas que informavam e outras que não o faziam evitando prejudicar o professor contratado.
No centro de desemprego, e procurando uma especialização que pudesse mudar o rumo da minha vida, deparei-me sempre com o entrave da licenciatura que possuía. (Tinha mais que isso, mas não mencionei). Todos os cursos existentes eram só para aqueles que ainda não tinham completado a escolaridade. Eu queria um curso qualquer médio que me possibilitasse trabalhar como esteticista. Conhecia pessoas que o tinham tirado e tinham tirado proveito dele. Não havia nada para os desempregados licenciados! Sobretudo para aqueles que não tinham dinheiro para frequentar um curso particular. Atingíramos o patamar mais alto, logo éramos castigados por tal. Todos as medidas tomadas, a nível governamental, só contemplavam pessoas que, a dado momento das suas vidas, tinham desistido dos estudos. A determinado momento, e vendo que todas as outras saídas estavam bloqueadas para mim, desejei também não ter completado a escolaridade para, naquele momento, poder ter uma saída que me preparasse para uma saída profissional alternativa. Pela primeira vez, na minha vida, senti que, neste país, ser licenciado era uma maldição. Sobretudo para as pessoas que se encontravam desempregadas! Todas as portas se fechavam!
Ora, lá porque atingimos aquilo que é considerado a escolaridade máxima (que não o é) não quer dizer que não precisemos de ter uma outra alternativa capaz de nos preparar para entrada no mercado de trabalho, nem que fosse para trabalhar por conta própria. Precisamos é de um curso médio que nos prepare para tal pois somos capazes de nos sair tão bem quanto os outros! Temos é de ter outras alternativa. Um conselho: deixem de olhar para os nossos certificados de habilitações, se não têm empregos para nós, digam-nos quais as possibilidades existentes e deixem-nos escolher à nossa medida como fazem aos outros. Não nos descriminem só porque somos licenciados… já que não têm alternativas para estes.
Acabaram as aulas. Sucederam-lhes as reuniões de avaliação com toda a burocracia que as caracteriza. (Para já não falar das primeiras reuniões que tiveram de se desenrolar a par das actividades lectivas ainda a decorrer nas escolas, uma vez que as restantes turmas só acabariam as aulas mais tarde.) São imensos papéis! Com a informatização do sistema, todo o trabalho parece recair sobre uma só pessoa – o Director de Turma. Este, a braços com toda a burocracia, assume, muitas vezes, a responsabilidade por toda a documentação envolvida no processo. O que não está certo, uma vez que toda a documentação é da responsabilidade de todos os elementos do Conselho de Turma. Lembro-me das reuniões, há alguns anos atrás, em que toda a documentação era distribuída uniformemente pelos docentes das mesmas, sendo toda ela preenchida e revista pelos participantes. Esse tempo, em muitas reuniões, parece ter terminado. Terá a informatização do processo toda a responsabilidade por esta situação? A resposta é claramente negativa! As pessoas são, mais uma vez, as responsáveis por ela. Depois as atitudes variam claramente de uns Conselhos de Turma para outros. Enquanto nuns, a documentação é distribuída por todos os docentes – a pedido destes – noutros tudo parece estar a cargo de uma só pessoa, com toda a responsabilidade que isso acarreta, esperando calmamente os restantes docentes pelo desenrolar da reunião. Trata-se, mais uma vez, de simpatias que formam grupos dentro das escolas. Enquanto numa reunião, o processo se desenrolava distribuído por diversos docentes: dois responsáveis por uma acta, um pelas sínteses ditadas pelos demais, etc., numa dinâmica que não dava para perceber exactamente qual deles era o Director de Turma, noutra, a situação mudava completamente de figura! Enquanto numa era tal a movimentação que um colega presente comentava que tinha perdido o fio à meada, noutra, o responsável da reunião não sabia para que lado se voltar! Enquanto que numa reunião os docentes que estavam de fora não percebiam exactamente em que poderiam ajudar, tentando evitar atrapalhar o esforço desenvolvido pelos voluntários, noutras reinava o trabalho desenvolvido pelo Director de Turma e o secretário, e noutras ainda, nem isso, recaindo tudo sobre aquele! Enquanto numas ninguém precisava de distribuir trabalho, noutras nem pediram documentação para preencher. Se formos a observar o que aconteceu, verificamos que o grupo de amizades estava a apoiar o incondicionalmente docente responsável pela reunião, para que o trabalho fosse levado a bom termo! O espírito de entreajuda foi espantoso! Dir-se-ia mesmo um verdadeiro espírito de equipa! O que é lamentável é que tal só se verifique nalguns conselhos de turma e pelo motivo errado!
Não são muitos, por isso são preciosos. E há-os um pouco por toda a parte. E fazem toda a diferença na vida das pessoas. Mesmo na das pessoas desconhecidas. Nunca lhes aconteceu ter o gesto certo, ainda que breve, no momento exacto e fazer a felicidade de uma pessoa? E não é preciso muito. Aliás, está provado que não são precisos grandes gestos para podermos ajudar as pessoas, mesmo as desconhecidas. É preciso boa vontade. E, com esta, podemos construir um pedacinho de céu na terra. Aconteceu isso mesmo, esta manhã, quando fui ao Centro de Saúde da minha área de residência, com a minha filha mais velha. A sala de espera estava repleta. Havia algumas pessoas de pé. Encontrámos lá, entre os pacientes, uma senhora idosa que não sabia ler nem escrever. Para além deste problema que a impedia de resolver convenientemente e com a pressa necessária os problemas, tinha a doença do marido (Alzheimer). Os filhos estavam longe. Contava com a ajuda de uma única sobrinha. Precisava de preencher um papel e não sabia como fazê-lo. Contou-me que uma senhora, empregada daquele centro, se dispusera a ajudá-la e, como prova disso, e passados alguns momentos, aproximou-se uma senhora alta, transpirando simpatia com o tal papel, pedindo à senhora que tirasse cópias dos documentos exigidos e o número de telefone que a idosa não sabia de cor. Repetiu pausadamente o recado até ter a certeza que a senhora tinha memorizado tudo. No fim, deu meia volta regressando ao seu posto para continuar o seu trabalho. Fizera tudo nos momentos de pausa. A idosa, com as lágrimas a afluírem aos olhos gratos e a voz trémula, agradeceu-lhe profundamente. Aquele gesto tinha evitado o desespero da pobre senhora. Era visível o seu alívio. Seguiu-se o comentário das pessoas presentes que notaram a nobreza do gesto manifestando-se agradadas. No final, todos estavam de acordo: as pessoas boas fazem a diferença onde quer que estejam. Na vida de todos, já houve experiências destas, experiências essas que não foram esquecidas e que são relembradas com gratidão. Mesmo nos momentos mais ingratos da vida e, como Sartre já dizia “l’enfer c’est les autres”, quando o mundo parece querer engolir-nos mesmo quando não fizemos mal nenhum, há sempre alguém mais distante ou mais próximo que faz toda a diferença, e sem se pronunciar sobre o assunto. Pessoas discretas mas equilibradas que, percebendo a desumanidade da situação (situações) ajudam, ainda que de forma despercebida, as pessoas acossadas. São estas que fazem toda a diferença. Os heróis existem no anonimato. E não são precisos grandes gestos. Para aquela idosa, a empregada foi uma heroína – a sua!
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